sábado, agosto 05, 2006

Excerto de "A viajante" Karla Suàrez

Recentemente estive de férias e adoro ler. Li um livro que foi daqueles de começar e só parar no fim..delicioso...Vou partilhar algumas partes , aquelas que se parecem mais com o que sinto, de vez em quando..

"A estação da chuva passa e regressa. A noite passa e regressa. O eterno retorno das coisas. Nós vamos ficando, lentamente, pedacinhos que se dissolvem nos dias. Não me resta outra salvação senão escrever. (ela mantinha um diário de bordo) E escrever tudo. Escrever as entranhas e as saudades. Escrever como se a alma se ausentasse numa tentativa de fuga sem regresso. Escrever como se os olhos se fossem tornando pó, pequenas partículas que, com a mudança de estado,se desvanecessem. E a única forma de reter o tempo, a única maneira admissível de limitar a sua pulverização, fosse a escrita. O relógio a contar os minutos e nós a saber que, no preciso instante em que a mão se detiver, a carne toda cairá no chão, irremediavelmente. Escrever tudo: o passar das horas e as respirações. Escrever o absurdo dos sentidos aparentes. A escuridão que não se vê. O silêncio no meio do bulício. O riso como solução do medo e o medo como solução perante a incapacidade de rir. Escrever que nos levantamos todos os dias sabendo que cá dentro estão a morrer células que são a nossa morte adiada; e temos de nos antecipar e fazer alguma coisa, ou então fazer de conta que não se passa nada e esperar. Escrever como se fosse a única certeza de que estivemos aqui. Escrever como se toda a existência precisasse de certidões: certidões de nascimento, certidões de óbito, e um selo, que garantam a nossa estadia. Escrever que entre certidão e certidão sofremos insónias e fomos felizes, que algumas coisas nos davam dores de barriga, e que espirrávamos quando olhávamos para o sol e tudo era importante embora fosse trivial, parte do quotidiano de todos os presentes. Não há existência que não mereça ser contada. Sem a tua existência e a minha, o mundo seria outra coisa. E quando deixarmos de estar será também outra coisa, talvez mais sábia. (...) Fica registado o processo de transformação da matéria. Que a porta de casa , antes de ser porta era um pedaço de madeira, que antes era árvore, que antes foi uma plantinha, que antes foi semente."

E pronto... Gostei do livro... acho que tem reflexões que têm muito a ver comigo. Espero que gostem deste pedacinho... se gostarem, depois dou mais

1 comentário:

ÞrincessFaßiana disse...

gostei... fico á espera de mais please... e talvez o va buscar para o ler todo! embora não tenha grande tempo... mas logo se vê, entretanto vou lendo os pedacinhos que nos dás...

beijos Fabi